Antônio Augusto de Queiroz*
A PEC 186/19, apelidada de “PEC Emergencial”, proposta pelo governo Bolsonaro, apresentada no dia 5 de novembro, por seu líder no Senado, Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE), propõe 3 mudanças estruturais nas finanças públicas, todas com impactos sobre os direitos dos servidores públicos:
1) torna permanente o Teto de Gasto Público, de que trata a EC 95;
2) estende sua aplicação aos estados, Distrito Federal e municípios; e
3) vincula a aplicação do Teto de Gasto à chamada “Regra de Ouro”. Além disso, veda que qualquer lei ou ato conceda ou autorize o pagamento, com efeitos retroativos, de despesa com pessoal, qualquer que seja a natureza da parcela ou benefício.
O Teto de Gasto Público, previsto na Emenda Constitucional 95 para durar por até 20 anos, será aprofundado, se for aprovada a PEC 186/19, que inclui no texto da Constituição Federal os artigos 167-A e 167-B, com o objetivo de suspender aumento de gasto e autorizar corte de direitos de servidores públicos.
Durante a sua vigência, se for rompida a “Regra de Ouro”, ou seja, se for necessário realizar operações de crédito em valor maior que as despesas de capital, ou seja, para cobrir despesas de custeio, ficará suspenso até mesmo o reajuste do teto de gastos pela variação do IPCA. Apenas essa medida terá gravíssimo impacto na despesa pública, acarretando a necessária redução de beneficiários ou valores de benefícios como bolsa família, BPC, aposentadorias, auxílios, subvenções, além de despesas de custeio de todo o governo federal.
A regra atual, da EC 95, estabelece, para cada exercício, limites individualizados, por poderes e órgãos da União, e determina a suspensão de aumento de gasto com pessoal, sempre que forem descumpridos esses limites orçamentários, os quais utilizam como referência os gastos autorizados no orçamento do ano anterior, corrigido pelo IPCA.
A nova regra, além de tornar permanente o ajuste fiscal, estendendo-o de forma compulsória aos estados e municípios, efetivamente, congela nominalmente o Teto de Gasto, determina, de modo automático, a suspensão de aumento de despesa com pessoal e também o corte de alguns direitos dos servidores sempre que for descumprida a “Regra de Ouro” — que ocorre quando as operações de créditos superam os investimentos governamentais — e não apenas quando extrapolar o gasto com pessoal, fixado em lei complementar, ou quando os limites individuais de despesas por poderes e órgãos forem descumpridos.
Como as despesas de capital (juros e encargos da dívida e investimento), pelo menos enquanto não houver superávit primário, continuarão por muitos anos inferior às operações de créditos necessárias ao financiamento da despesa total, via projetos de créditos suplementares ou especiais, serão automaticamente acionados mecanismos de estabilização e ajuste fiscal, sendo vedadas aos poderes e órgãos da União:
I - concessão, a qualquer título, de vantagem, aumento, reajuste ou adequação de remuneração de membros de Poder ou de órgão, de servidores e empregados públicos e militares, exceto dos derivados de sentença judicial transitada em julgado ou de determinação legal decorrente de atos anteriores ao início do regime de que trata este artigo;
II - criação de cargo, emprego ou função que implique aumento de despesa;
III - alteração de estrutura de carreira que implique aumento de despesa;
IV - admissão ou contratação de pessoal, a qualquer título, ressalvadas as reposições de cargos de chefia e de direção que não acarretem aumento de despesa e aquelas decorrentes de vacâncias de cargos efetivos ou vitalícios;
V - realização de concurso público, exceto para as reposições de vacâncias previstas no inciso IV;
VI - criação ou majoração de auxílios, vantagens, bônus, abonos, verbas e de representação ou benefícios de qualquer natureza em favor de membros de Poder, do Ministério Público ou da Defensoria Pública e de servidores e empregados públicos e militares;
VII - aumento do valor de benefícios cunho indenizatório destinados a servidores públicos e seus dependentes e;
VIII - criação de despesa obrigatória;
IX - adoção de medida que implique reajuste de despesa obrigatória acima da variação da inflação, observada a preservação do poder aquisitivo referida no inciso IV do caput do art. 7º da Constituição Federal;
X - criação ou expansão de programas e linhas de financiamento, bem como a remissão, renegociação ou refinanciamento de dívidas que impliquem ampliação das despesas com subsídios e subvenções; e
XI - concessão ou a ampliação de incentivo ou benefício de natureza tributária.
Adicionalmente, além das vedações listadas acima, serão adotadas as seguintes suspensões:
I - da destinação a que se refere o art. 239, § 1º da Constituição Federal (repasse de recursos do FAT para o BNDES); e
II - de progressão e da promoção funcional em carreira de servidores públicos, incluindo os de empresas públicas e de sociedades de economia mista, e suas subsidiárias, que receberem recursos da União para pagamento de despesas de pessoal ou de custeio, com exceção das promoções:
1) de que tratam o artigo 93, inciso II (juízes);
2) dos membros do Ministério Público;
3) do Serviço Exterior Brasileiro;
4) das carreiras policiais; e
5) demais que impliquem alterações de atribuições.
Além disso, ficam os poderes e órgãos da União autorizados, por atos normativos, a promover redução temporária em até 25% na jornada e nos salários dos ocupantes de cargos, funções e empregos públicos da administração pública direta, autárquicas e fundacional, em duas hipóteses:
1) descumprimento dos limites de gasto com pessoal, fixado em lei complementar; e
2) descumprimento do Teto de Gasto.
Na esfera da União, portanto, haverá uma regra permanente de “ajuste fiscal obrigatório”, complementando o Teto de Gastos da EC 95, o qual, se presente a situação de déficit público, será ainda mais drástico do que já é.
A PEC prevê que os estados, o Distrito Federal e os municípios deverão adotar os mecanismos de estabilização e ajuste fiscal acima citados toda vez que a relação entre despesas correntes e receitas correntes superar 95%, mantendo tais restrições enquanto remanescer a situação. Assim, se a receita corrente aumentar acima da inflação, a despesa corrente poderá aumentar na mesma proporção, mas não poderá, nunca, exceder a 95% da receita corrente do ente.
Fixa ainda, a partir de 2026, o limite de 2% do PIB para benefício ou incentivo de natureza tributária pela União, vedando a sua criação, renovação ou ampliação se esse limite houver sido atingido.
Este é, em síntese, o objetivo da PEC 186, proposta pelo Poder Executivo e apresentada ao Senado pelo líder do governo na Casa, Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE).
(*) Jornalista, analista e consultor político, diretor de Documentação licenciado do Diap e sócio-diretor das empresas “Queiroz Assessoria em Relações Institucionais e Governamentais” e “Diálogo Institucional Assessoria e Análise de Políticas Públicas”.