Na pauta econômica do governo Bolsonaro é central a proposta de uma reforma da previdência regressiva para os trabalhadores. Mas, o super ministro da economia, Paulo Guedes, anunciou que pretende ainda iniciar transição para um sistema previdenciário completamente diferente – e pior -, o regime de capitalização, para as gerações futuras.Esse regime consiste em uma espécie de poupança que o próprio trabalhador é obrigado a fazer, com um percentual do salário, para compor sua aposentadoria. O empregador fica desobrigado de contribuir. Rompem-se a solidariedade intergeracional, o financiamento tripartite (trabalhador-estado-empregador) e perdem-se garantias do atual modelo de repartição.Na capitalização, a gestão das contas é privada, podendo ser feita por bancos, seguradoras ou fundos. Não há previsibilidade para o valor das aposentadorias. O trabalhador dependerá exclusivamente do rendimento dos depósitos acumulados no (volátil) mercado financeiro. Isso em um país de intensa rotatividade e instabilidade do mercado de trabalho.É um sonho para bancos e outros agentes do mercado financeiro abocanhar uma grande fatia do que hoje é orçamento público. A apropriação de parte da poupança dos trabalhadores se daria através da especulação sobre esses depósitos e através da cobrança de taxas de administração. A realidade das previdências privadas ou complementares hoje indicam o que pode ocorrer.O fracasso do sistema de capitalização no ChileO modelo proposto por Paulo Guedes tem inspiração no sistema chileno, implantado pelos economistas ultraliberais da ditadura Pinochet, com os quais o ministro de Bolsonaro estreitou laços na década de 80. Esses economistas foram formados na escola de Chicago, por isso apelidados de “Chicago Boys”, e eram marcados pelo extremismo da ideologia neoliberal, que também caracteriza Guedes e sua equipe. Esses extremistas foram responsáveis pelo “privatiza tudo” que atingiu previdência, saúde e educação naquele País.As multinacionais financeiras (até a BTG brasileira) e os maiores empresários do país foram fartamente beneficiados e carrearam capital para a privatizada previdência como forma de potencializar a acumulação. As AFP’s (administradoras de fondo de pensiones) se tornaram o único sistema de seguridade à disposição dos trabalhadores. O mercado começou com vinte e hoje é oligopilizado por apenas seis AFP’s. A taxa de lucro durante todo o período de existência é fabulosa. Em 2017 o ganho foi de 348 bilhões de pesos. O marketing agressivo e o lobby combinado com corrupção mantêm intacto o sistema, mesmo diante da massiva pressão popular pela sua substituição.A especulação e a imposição combinada de altas taxas de administração, mas sobretudo a natureza individualista, não solidária e não tripartite do modelo vem causando enormes prejuízos à classe trabalhadora. Os aposentados são submetidos a um processo de brutal empobrecimento. Enquanto nos países da OCDE a média do valor da aposentadoria é de 70% do rendimento da ativa, as APF’s chilenas pagam em média 40% do salário da ativa.Para as mulheres essa média de 10% menor que para os homens. Recebem salário menor, têm mais alto índice de desemprego, vivem mais, se dedicam mais a trabalhos não remunerados (domésticos, cuidados com filhos e familiares). A estrutura machista lega para as mulheres ainda um índice mais grave de miserabilidade na velhice.Esse modelo ultraliberal levou o Chile ao primeiro lugar em índice de suicídio de idosos da América Latina. Mas, a sociedade civil vem reagindo. Nos últimos dois anos, foram várias e grandes as manifestações de sindicatos, partidos e outros entes da sociedade. Construiu-se um movimento chamado No+AFP (algo como chega de Administradoras de Fundos de Previdência), que exige o fim do sistema privatizado e a constituição de um sistema público, tripartite e solidário, através de um projeto de lei de iniciativa popular.O país andino já aplicou reformas nesse modelo privatizado com vistas a atender faixas mais vulneráveis da população. A cidadania luta para construir um sistema mais civilizado e humanizado, mas assente com o princípio da dignidade humana e mais aproximado de recomendações de organismos internacionais, como a OIT. Os servidores e demais trabalhadores não podem permitir que o Brasil tome a contramão.
Fontes: UOL Economia; Revista Forum; Diálogos do Sul; No+AFP (http://www.nomasafp.cl/inicio/?page_id=8)
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