A pretexto de enfrentar a crise sanitária decorrente da pandemia do COVID-19 e seus efeitos econômicos e sociais, representantes dos Poderes Executivo e Legislativo e do mercado (inclusas as empresas concessionárias de comunicação) vêm apresentando propostas de sacrificar mais ainda servidores e demais trabalhadores.
No dia 22 de março, o presidente da República, Jair Bolsonaro (Sem partido), editou, na madrugada de um domingo, a Medida Provisória n.º 927/2020 facultando, entre outras medidas, a suspensão do contrato de trabalho por até quatro meses, sem garantia de salário ou de estabilidade.
A MP, que reproduz documento da Confederação Nacional da Indústria (CNI), retira o direito a negociação coletiva, concede benefícios tributários aos empregadores e restringe a fiscalização do trabalho e até a Lei de Acesso à Informação.
O presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), segue empenhado em aprovar a PEC n.º 186, chamada de emergencial. Essa proposta compõe o chamado “Plano mais Brasil”, que prevê mais restrições fiscais para a despesa pública, aprofundando o regime da EC n.º 95, inclusive através de redução de salário dos servidores. Uma “reforma administrativa” de mesmo caráter pode ser apresentada pelo Governo.
Ainda na Câmara, ocorrem articulações em torno de outras propostas de redução salarial e suspensão de direitos de trabalhadores do setor público e do setor privado, a pretexto de mitigar os efeitos da crise na arrecadação ou de arregimentar recursos para investir no enfrentamento da pandemia. E projetos de ajuda financeira a estados e municípios, principais responsáveis pela saúde pública, condicionam a privatizações de setores como gás e energia.
Contudo, não se vislumbra nenhum plano consistente para salvaguardar a vida, a saúde e o sustento digno de uma imensa massa de desempregados e de trabalhadores informais. A Nota Técnica do DIEESE revela as debilidades do plano emergencial do Executivo.
QUEREMOS DIÁLOGO, PROTEÇÃO DA VIDA E JUSTIÇA!
Todas as propostas citadas trazem a marca da ausência de diálogo social. Trata-se da imposição unilateral de sacrifícios aos trabalhadores, afastando a negociação coletiva, desprezando nossas entidades representativas. Essa forma de agir aprofunda os conflitos sociais em momento que exige ampla união nacional.
Outra característica indelével dessas iniciativas é o oportunismo. É verdadeiro abuso político desse momento de extrema fragilidade da sociedade organizada querer seguir implantando uma agenda ideológica ultraliberal e fiscalista cujo fracasso é evidente no Brasil e em vários países, alguns em situação de caos social inclusive.
As propostas apresentadas trazem outra mácula trágica: a profunda injustiça na distribuição dos custos da crise. Os trabalhadores já vêm sendo penalizados com os efeitos negativos da EC n.º 95 (a “Lei do Teto de gastos”), que prejudica as despesas de interesse social – como o investimento no SUS, desfalcado já em mais de 20 bilhões de reais!
A classe trabalhadora foi duramente defraudada com a “reforma trabalhista” e “terceirização irrestrita”, que arrasaram a proteção legal das desiguais relações de trabalho, e com a “reforma da previdência”, que rebaixou direitos previdenciários e deverá desfalcar da aposentadoria dos setores mais pobres, nos próximos 10 anos, em torno de 600 bilhões de reais.
O Brasil continua um dos mais desiguais do Planeta. Algo como 50% de toda a riqueza nacional está concentrada com menor de 1% das famílias. No entanto, o sistema tributário isenta mais de 70% da renda dessas famílias de imposto de renda de pessoa física. Lucros e dividendo não estão passíveis de incidência desse imposto. A tributação de patrimônio e renda mal alcança a metade da média dos países da OCDE. O setor financeiro, privilegiado com lucros médios de 120 bilhões de reais em plena recessão, é sub tributado.
A Constituição de 1988 segue sob grave violação por omissão ao não se regulamentar a instituição de imposto sobre grandes fortunas (IGF). Estudos apontam que pequenas alíquotas entre 1% e 3% sobre patrimônios com valor acima de 20 bilhões de reais poderiam gerar arrecadação de algo como 40 bilhões de reais ao ano.
Impõe-se registrar que, apesar de tantas restrições às despesas sociais, não se conhece limite algum à despesa financeira. O monumental gasto com juros e amortizações da dívida pública consome em torno de 1 trilhão de reais ao ano, representando em média 40% de todo o orçamento da União.
Dessa forma, nos somamos às demais organizações da sociedade civil e da classe trabalhadora para cobrar as seguintes medidas para enfrentamento da múltipla crise sanitária e econômica:
a) Abertura imediata de DIÁLOGO SOCIAL com as entidades representativas dos trabalhadores, cessando a imposição de medidas unilaterais, enquanto a população sequer pode sair às ruas para protestar;
b) SUSPENSÃO IMEDIATA DO PAGAMENTO DA DÍVIDA PÚBLICA, destinando todo o recurso economizado ao fortalecimento do SUS e prevenção/tratamento do COVID-19! E auditoria com participação da sociedade para verificar a legalidade e legitimidade dessa que é maior despesa da União!
c) REVOGAÇÃO IMEDIATA DA ISENÇÃO DE IRPF SOBRE LUCROS E DIVIDENDOS. O Brasil é quase o único país do Mundo a manter esse privilégio.
d) Instituição de IMPOSTO SOBRE GRANDES FORTUNAS, como previsto na Constituição.
e) REVOGAÇÃO IMEDIATA DA EMENDA CONSTITUCIONAL N.º 95.
f) SUSPENSÃO IMEDIATA DA VOTAÇÃO DAS PECs 186, 187 E 188.
g) PROGRAMA EMERGENCIAL DE RENDA MÍNIMA PARA DESEMPREGADOS E INFORMAIS.
h) REPULSA A QUALQUER PROJETO DE CORTE DE SALÁRIOS DO SETOR PRIVADO E DO SETOR PÚBLICO.
Recife, 24 de março de 2020.
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